domingo, 15 de dezembro de 2013

Uma casa em que vivi

Costuma-se dizer que Lar é o lugar onde o coração vive. Mas há quem diga que é a própria Casa que possui vida.

O alvorecer, quando traz luz e calor para o recomeço do mundo, preenche e renova a vida que pulsa em cada canto da Casa.

No quarto de dormir, apenas o ressonar suave das cortinas modestas, que se movem passivamente quando tocadas pela brisa matinal, quebra o silêncio. O espelho na porta do guarda-roupa antigo reflete todos os pequenos detalhes que foram cuidadosamente decorados ao longo dos anos: pequenos bibelôs – lembranças de viagens e encontros e agrados, a imagem da Virgem esculpida em barro e que sempre mantém vigilância, a cama de Casal – sempre protetora e reconfortante, o receptáculo dos sonhos de uma vida – um bilhete qualquer sobre a mesinha de cabeceira, guardando uma mensagem que ficará preservada até o fim dos tempos.

Assim como seus habitantes, a Casa também desperta de seu sono reparador à mesma hora. Gradativamente, cada cômodo parece espreguiçar-se e ganhar ânimo novo e acordar para a Vida.

A luz do Sol invade a sala de estar através da janela que vive emperrada; e é como se a garotinha do quadro protestasse por ter seus olhos desenhados perturbados pelas réstias de luz. Os livros antigos parecem brigar por espaço na estante abarrotada de coisas, como se o contraste entre novo e velho fosse uma batalha diária. E existem também os resquícios das pequenas travessuras infantis, que estão presentes nas marcas da parede, meros lembretes de que a criança ainda vive naquela Casa.

O resto da Casa abandona a sonolência aconchegante quando o aroma da primeira refeição do dia insinua-se por cada brecha. O som dos utensílios domésticos e do movimento na cozinha misturam-se às vozes murmuradas, quando a Casa e a Vida renovam-se para um novo dia.


(Jéssica Oliveira – 18/09/2007)

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